Posts Tagged ‘biologia’

Cérebro Eletrônico V

setembro 3, 2015

impulsos-nervosos-3

Os seguidores deste blog sabem que um dos assuntos de que mais gosto é o que está relacionado ao cérebro. Se clicarem na tag cérebro e mente notarão vários posts sobre o tema. Há muito tempo criei uma sequência, que eu chamei de cérebro eletrônico, que procura abordar a questão da inteligência artificial, mas sem se restringir a essa única temática. Assim acabei tocando em outros temas nos posts passados.

Quando falamos em IA (inteligência artificial) surge logo a discussão sobre a grande questão:

As máquinas irão se rebelar contra os seres humanos?

Pode parecer uma pergunta boba, mas não é. Alguns pesquisadores acham que não faz sentido atribuirmos sentimentos humanos para uma máquina. Outros, ao contrário, acreditam que a discussão já deveria ter começado1.

Outras questões importantes são:

Somos apenas um estágio intermediário na evolução?

Supercomputadores ou robôs inteligentes nos sucederão?

Mesmo que a inteligência artificial seja alcançada, ela nunca irá superar a inteligência humana?

Talvez a resposta não seja nem uma coisa nem outra. Nossa tendência em analisar as coisas de forma dicotômica quase sempre nos leva a tomar partido de um lado ou de outro. Normalmente essa atitude impede que outros caminhos sejam analisados e levados em consideração.

O que estou querendo dizer é que talvez, uma fusão homem-máquina, seja a tendência futura. Inúmero são os exemplos onde isso já está acontecendo, mas um artigo a ser publicado nesse mês apresenta um avanço bem interessante, um neurônio artificial que se conecta a células humanas2.

Até hoje a interface cérebro-máquina era feita através de sensores e é então enviada a algum tipo de aparelho que possa interpretar esses resultados. Esse novo artigo apresenta outra forma de conexão do sistema nervoso humano a uma máquina e vice-versa.

Segundo o artigo, um neurônio artificial é capaz de receber sinais químicos e produz sinais elétricos, funcionando portanto, como um tradutor para uma interface entre o sistema biológico e um sistema eletrônico.

Uma das primeiras aplicações, pensadas pelos autores do artigo, é no uso de terapias neurológicas. As aplicações ainda estão muito distantes, até mesmo por uma questão física, o neurônio artificial é muito grande e precisa ser miniaturizado. Espera-se que através dele seja possível a comunicação entre neurônios que estejam separados por uma lesão por exemplo. O estudo com células tronco é uma promessa para esse tipo de terapia, mas talvez uma solução artificial surja primeiro que a biológica.

Muito tempo se passou desde que a primeira pessoa usou um óculos, ou uma bengala. Hoje temos avançadas próteses, que substituem membros, e até sensores auditivos e visuais. Mas para o sistema nervoso ainda são poucos os avanços.

Um neurônio artificial, que possa ser interligado a um sistema nervoso, poderá ser um passo gigantesco, não apenas para as terapias neurológicas, mas também para a evolução da inteligência artificial.

Os ciborgues (meio homem meio máquina) poderão ser uma realidade em breve, não como agentes especiais (quem nasceu na década de setenta deve se lembrar do famoso “homem de seis bilhões de dólares”, ou da “mulher biônica”) nem como exterminadores do futuro.

Há pouco mais de cinquenta anos o primeiro marcapasso foi implantado. Esse aparelho monitora o batimento cardíaco e fornece, quando necessária, uma corrente elétrica para garantir que o coração bata em um ritmo adequado. Obviamente que não dá para comparar a complexidade do cérebro com a simplicidade do coração, mas acredito que bem antes dos próximos cinquenta anos teremos muitos ciborgues entre nós.

Referências bibliográficas:

1 Robôs Assassinos – Jacó I. Moura – Blog 12 Dimensão – 15 de julho de 2014- Disponível em: https://12dimensao.wordpress.com/category/cerebro-e-mente/

2 -An organic electronic biomimetic neuron enables auto-regulated neuromodulation
Daniel T. Simon, Karin C. Larsson, David Nilsson, Gustav Burström, Dagmar Galter, Magnus Berggren, Agneta Richter-Dahlfors
Biosensors and Bioelectronics
Vol.: 71, 15 September 2015, Pages 359-364
DOI: 10.1016/j.bios.2015.04.058

2 – Neurônio artificial conecta-se a células humanas –  Site:Inovação tecnológica. Disponível em: http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=neuronio-artificial-conecta-se-celulas-humanas&id=010180150703&ebol=sim#.VZs5SxtViko – Acesso em 08/07/2015

3 – Imagem retirada do site: 5coisas para viver na excelência – curiosidades sobre o corpo humano – disponível em: http://5coisas.org/5-curiosidades-sobre-o-corpo-humano-anatomia/ – Acesso em 03/09/2015

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Há mais coisas entre você e seu intestino, caro leitor, que sonha a nossa vã filosofia

setembro 11, 2012

Exemplos de bactérias microbianas intestinais (sem escala e cores artificiais)

Em uma conversa durante um almoço, meu amigo e professor de biologia José Manoel, mencionou um artigo muito interessante que ele havia lido. Convidei-o então a escrever um post aqui no 12a. Dimensão, uma vez que ele é leitor assíduo e contribui bastante com seus comentários. Pra ser sincero achei que ele iria aguardar as férias mas para minha grata surpresa ele me enviou em alguns dias esse escrito que reproduzo abaixo. Espero que gostem assim como eu gostei. Obrigado Zé. Abraço

Jacó

Por:   José Manoel Martins

Mestre em Zoologia e Doutor em Ciências Biológicas pelo Instituto de Biociências da USP, professor de Biologia no EnsinoMédio do Colégio Oswald de Andrade e autor de Ciências do Ensino Fundamental II (Editora Saraiva) e do Sistema Anglo de Ensino e  pH Sistema de Ensino

O título desse texto, uma alusão a Hamlet, de Shakespeare (que espero que me perdoe de seu túmulo), me veio à mente após a leitura do artigo da revista Carta Capital de 29 de agosto de 2012, pp:54-59 (www.cartacapital.com.br), intitulado Nós e as bactérias, uma tradução feita do artigo original publicado pela revista The economist (www.economist.com), que traz uma visão pouco comum em relação às bactérias que habitam o nosso organismo. O artigo completo pode ser encontrado em: http://www.abradilan.com.br/noticias_detalhe.asp?noticia=11913.

Uma das reflexões que o artigo traz e que me chamou mais a atenção foi a de que “O óvulo e o esperma [do ser humano] fornecem cerca de 23 mil genes diferentes. O microbioma, como são chamadas coletivamente as bactérias comensais do corpo, teria cerca de 3 milhões.” Isso é fantástico! Pensar que além dos nossos próprios genes, também contamos com uma gama de genes de bactérias que vivem em simbiose com nosso organismo, nos faz pensar sobre o nosso conceito de organismo – seríamos apenas o conjunto de nossas células, provenientes do ovo gerado pelos óculo óvulo  e espermatozoide de nossos pais, ou seríamos esse pequeno ecossistema formado também pelos nossos simbiontes?

Várias substâncias que ingerimos, não são digeridas por nosso conjunto enzimático (produto de nossos genomas), mas sim por enzimas produzidas por bactérias simbiontes de nossos intestinos. É o caso, por exemplo, dos glicanos, açúcares comuns no leite mas que são apenas digeridos por enzimas bacterianas – e não é à toa que essas bactérias estão em nosso intestino num perfeito exemplo de coevolução homem-bactéria.

Essa ajuda mútua entre bactérias e homem em processos de digestão não é uma exclusividade desses seres vivos, bactérias que vivem em estômagos de animais herbívoros, como vacas, cavalos ou veados, também realizam importante papel na digestão, entre outras substâncias, do carboidrato celulose, de onde esses animais vão obter compostos importantes para seus processos metabólicos.

Mas voltando às bactérias e seres humanos, o artigo relata uma série de substâncias que são eliminadas pelas bactérias em sua digestão e que são absorvidas pelo homem, como “pequenas moléculas de ácido graxo, especialmente ácido fórmico, ácido acético e ácido butírico, que podem atravessar as paredes do trato digestivo e entrar na corrente sanguínea, de onde são inseridas nos caminhos bioquímicos que ou liberam energia delas (10% a 15% da energia usada por um adulto médio são gerados dessa maneira), ou as depositam como gordura.”

Descobertas recentes, como indica o artigo, já relacionam a fauna microbiana com várias doenças, entre elas a obesidade e a desnutrição. Os resultados apontam para a presença de microbiomas diferentes em pessoas obesas e magras e também que as bactérias “realmente participam do processo de emagrecimento, suprimindo a produção de um hormônio que facilita o armazenamento de gordura, e de uma enzima que impede a queima da gordura.”

No caso da desnutrição, os cientistas, estudando grupos de gêmeos fraternos e idênticos, encontraram microbiomas diferentes entre indivíduos bem alimentados e malnutridos, isto é, “ter o tipo errado de bactéria pode causar desnutrição.“ Esta é causada, principalmente, pela ausência de uma dieta adequada, mas também parece que as bactérias têm um papel importante nessa condição. Tratar pessoas desnutridas com uma “dose” de certas bactérias poderá ser um caminho para a cura.

O artigo da Carta Capital ainda aponta para a relação microbiana com doenças cardíacas, diabetes, esclerose múltipla e vários outros distúrbios:

Doença cardíaca I – quanto maior a quantidade encontrada na urina humana de ácido fórmico, produzido pelo microbioma intestinal, menor a pressão sanguínea e portanto, menor também a chance de doenças cardíacas.

Doença cardíaca II – experimentos em ratos especialmente criados para ser suscetíveis ao endurecimento das artérias mostram que a morte do seu microbioma (por meio de antibióticos), reduz “significativamente sua aterosclerose, embora o motivo disso permaneça obscuro.”

Diabetes – pessoas com obesidade mórbida, quase sempre diabéticas Tipo 2 (em que as células do corpo se tornam insensíveis à insulina), e que são submetidas a “um procedimento conhecido como Rouxen-Y, que cria um desvio (bypass) no intestino delgado e assim reduz a quantidade de alimento que o corpo pode absorver”, acabam por emagrecer e praticamente a “zerar” sua diabetes. Isso está sendo explicado pela alteração na composição do microbioma intestinal, resultante da intervenção cirúrgica e que de alguma forma faz com que a diabetes desapareça.

Esclerose múltipla – é uma doença autoimune (distúrbio em que o sistema imunológico da pessoa se volta contra si mesmo), na qual ocorre a retirada de sua bainha de mielina das células nervosas, o que as tornam inviáveis para a condução do impulso. Foi demonstrado que em ratos as bactérias intestinais participam do início do processo de reconhecimento das células nervosas como “inimigas”.

O uso de iogurtes conhecidos como próbióticos (composto por vários tipos de bactérias do iogurte), no caso de pessoas com a síndrome do intestino irritável, realmente melhora suas condições clínicas. Essa seria uma espécie de troca de bactérias “doentes” por outras “saudáveis”, mas não se sabe se realmente isso acarreta algum benefício em pessoas sem a síndrome. Aliás, estudos mostram que em gêmeos o uso ou não do iogurte não modificou seus microbiomas.

Certos procedimentos podem até parecer escatológicos demais para serem “bons”, mas eles têm demonstrado bons resultados. Trata-se da transferência de microbiomas inteiros de um intestino sadio para um doente, isto é, um transplante fecal (eca!). Casos comuns em que esse procedimento está sendo empregado ocorre em infecções, geralmente hospitalares, pela bactéria Clostridium difficile, causador de diarreia severa. “Os novos micróbios multiplicam-se rapidamente e tomam conta do intestino grosso, expulsando a C. difficile.

Doenças como o autismo também podem estar relacionadas com o microbioma intestinal. A competição que existe no ecossistema intestinal entre as bactérias presentes, pode levar à produção de substâncias como os fenóis (fabricadas por certas bactérias para matar eventuais competidoras) que, no entanto, também são tóxicas para as células humanas. Para neutralizar esses fenóis, nosso corpo produz substâncias à base de enxofre, que pode se tornar escasso devido à grande produção e, assim, prejudicar o desenvolvimento do cérebro que necessita muito desse elemento. E o que isso tem a ver com o autismo? Não se sabe ao certo se a relação é direta entre os resultados dessa competição microbiana e o autismo, mas indivíduos com essa doença costumam ter problemas com o metabolismo do enxofre.

Essa área da ciência, pela facilidade que as novas técnicas de estudo do DNA das bactérias permitem, está bem na moda. No entanto, como o artigo diz: “isto em si acarreta riscos.” Pode ser que toda essa importância para o microbioma que parece estar sendo cada vez mais aclamada seja inadequada, como também o foi a sua total negligência.

O fato é que o microbioma está relacionado com a nossa alimentação, com o funcionamento correto (ou não) de várias de nossas funções fisiológicas e que também pode explicar doenças aparentemente genéticas, mas que eram difíceis de identificar em nosso próprio genoma, por na verdade estarem ligadas ao genoma de nossos companheiros intestinais. Algumas dessas bactérias podem ser herdadas de mãe para filho no parto, mas outras chegam a nós diretamente pelo ambiente que nos cerca. De certa forma, podemos pensar que “herdamos” genes da mãe, sem ser propriamente dela e genes de seres que nem são da nossa espécie! Em contrapartida, poderemos tratar de doenças genéticas via o microbioma, na forma de transplantes ou de uso de antibióticos, por exemplo.

No final das contas, há cerca de 10 vezes mais células de microbianos em nosso corpo que as células propriamente nossas. Somos formados por muito mais que apenas a nossa herança biológica de nossos pais, somos um pequeno microcosmo de seres simbiontes que querem (ou preferem?) interagir de forma equilibrada conosco, mas eles precisam de nossa contribuição para isso. Certamente, no futuro, a abordagem dessa interação estará mais presente nos consultórios médicos. Talvez uma frase que venha a ser dita possa ser “Me diga que bactérias tens que te direi quem és”.

 bibliografia:

http://4.bp.blogspot.com/-zmiz1Ptcf2g/TpMANllJrzI/AAAAAAAAA1s/YEFF4wV5dsM/s1600/microbiota-diversa-de-bacterias-y-hongos.jpg – Acesso em 05/09/2012

http://www.abradilan.com.br/noticias_detalhe.asp?noticia=11913. Acesso em 05/09/2012

Quando o cientista presta um desserviço

maio 12, 2012
Quem costuma entrar semanalmente aqui no Décima Segunda Dimensão sabe que sou um defensor do pensamento cético e da importância do saber científico. Não poderia ser diferente, uma vez que escolhi a profissão de professor de uma área científica. No entanto procuro sempre me policiar para não passar uma visão errada de como a ciência trabalha. Busco deixar claro que a ciência não é a dona da verdade, que ciência trabalha com modelos e não com verdades absolutas. Que não há um porta voz da ciência, que para algumas teorias ou hipóteses pode haver um grande consenso, mas que isso não é uma regra geral, há inúmeras teorias que são conflitantes e inúmeros debates na ciência.

É assim que a ciência funciona, pelo debate, pelo eterno questionamento, pela dúvida. Dúvida que se estende até mesmo às teorias já consolidadas. Mesmo depois de quase trezentos anos do domínio de Newton na mecânica, sua teoria foi derrubada pela Relatividade de Einstein. A única certeza que temos na ciência é que suas verdades são provisórias. Mas isso não faz com que tudo seja relativo, isso não significa que não possamos emitir opiniões e de afirmarmos como as coisas funcionam, ou não proíbe que previsões sejam feitas (e muitas inclusive se verificam).

Na semana passada um cientista da área de climatologia apareceu no programa do Jô Soares e fez afirmações bem polêmicas. Como acabei de afirmar nos parágrafos acima, a polêmica é um dos ingredientes que movem a ciência, junto com a curiosidade é a responsável pelas grandes descobertas. Mas não concordo com o modo como esse cientista fez essas afirmações.

Ao ser apresentado como especialista em climatologia e professor da USP, sua autoridade não tem como ser questionada no programa, por isso acredito que ele deveria ter agido com mais responsabilidade.

Mas o que foi que essa pessoa afirmou que me indignou tanto?

Na verdade não foram suas afirmações. Não foi o fato de ele afirmar que não há aquecimento global, não existe efeito estufa, não existe camada de ozônio, que se a floresta Amazônica for destruída completamente se recupera em vinte anos, e que as ações do homem são todas insignificantes e contidas a uma mudança local, sem impacto no planeta como um todo. Acho importante que existam pesquisadores que façam o contraponto, que pesquisem e apontem erros naquilo que quase todos estão certos. A unanimidade é burra já dizia Nelson Rodrigues. O problema, como já disse, foi a forma COMO ele fez essas afirmações.

Ao fazer essas afirmações, o dito professor não deixou margem a dúvidas. Fez parecer que há uma grande conspiração para enganar todas as pessoas do planeta, sobre as previsões climatológicas. Eco-92, IPCC, Rio +20 essas reuniões todas de cientistas e especialistas não passam de conspiração para que novos produtos sejam inventados e para que se mantenha o consumo desenfreado.

Com ironia e sem apresentar trabalhos técnicos atuais ele simplesmente disse que os “cientistas sérios” não acreditam nessas previsões alarmistas. Mas ele não disse quem são os cientistas sérios, acusou os outros de “cientistas chapa-branca” financiados por governantes desses países que querem manter a produção desenfreada.

Dessa forma a impressão que ele passou, e pude constatar isso através de alunos que assistiram ao programa, foi que somos um bando de otários preocupados com a ação do homem sobre a natureza, sendo que essa ação seria muito pequena. Estamos sendo enganados ao defender um desenvolvimento sustentável, que cause menos impacto ao meio ambiente.

Como se tratava de uma entrevista em um programa que é mais de humor do que informativo devemos dar um desconto à atitude do cientista. Jô Soares é mestre em interromper o entrevistador e de não deixá-lo concluir um assunto, emendando uma pergunta na outra e ridicularizando muitas vezes a explicação. Nem que para isso ele finja desinformação (eu duvido que o Jô Soares não saiba que a Amazônia não é o “pulmão do mundo”). Mas enfim, muita coisa foi dita e muitos assuntos foram misturados de tal forma que ficou tudo muito confuso.

Deixe-me dar um exemplo de duas coisas diferentes que no programa se misturaram: O aquecimento global e o efeito estufa. Há uma enorme confusão entre esses dois conceitos.

Efeito estufa existe sim, e é graças a ele que temos uma temperatura média no planeta que permite a existência de formas de vida como a nossa. Nosso planeta possui uma atmosfera formada basicamente de nitrogênio e oxigênio, 70% de nitrogênio e 29% de oxigênio. Os outros 1% restantes são formados por diversos gases, o vapor de água, o metano, o dióxido de carbono (CO2), o enxofre, entre outros. O vapor de água, o metano e o dióxido de carbono são os principais gases estufa da atmosfera. Eles permitem a entrada da luz solar e dificultam a saída do infravermelho, radiação emitida pelos corpos que foram aquecidos por essa luz solar. Esse fenômeno acontece em uma escala bem menor no interior de um carro que está com os vidros fechados sob o Sol. Se não fosse o efeito estufa nosso planeta seria como a Lua, que durante o dia pode atingir 70oC e a noite −20oC (a presença de água em nosso planeta também é importante para diminuir essa flutuação térmica).

Chamamos de aquecimento global a elevação da temperatura média do planeta. Esse aumento de temperatura pode ser provocado por vários motivos e ao longo da história evolutiva de nosso planeta há períodos de aquecimento global e períodos de resfriamento global.

Não há dúvida sobre esses dois conceitos. Há diversas maneiras de se estimar qual era a temperatura do nosso planeta em eras passadas, e esses períodos de aquecimento e resfriamento podem ser comprovados. A grande discórdia ocorre sobre qual seria o impacto da ação do ser humano no clima do planeta como um todo, o chamado aquecimento global antropogênico.

Concordo que há um exagero nas consequências de um possível aquecimento global. Um catastrofismo exacerbado que procura através do medo, despertar a consciência ecológica das pessoas. Esse tratamento ocorre principalmente na mídia em geral. Sempre com matérias sensacionalistas, grandes inundações, secas, tempestades, furacões. Nos filmes então, melhor nem começar a falar sobre isso.

Meu amigo e professor de geografia do Colégio Oswald, Amadeu, me indicou um documentário feito pela BBC: A grande farsa do aquecimento global (The Great Global Warming Swindle) produzido por Martin Durkin e exibido pela produtora britânica  Channel 4.

Como o próprio Amadeu havia me adiantado há visões bem conservadoras e neoliberalistas no documentário. Ele é totalmente parcial, e denuncia uma espécie de complô para tornar o aquecimento global um fato inquestionável, defendido por toda comunidade científica. O filme entrevista diversos cientistas que se opõem a essa visão e afirmam serem perseguidos por essas opiniões. Ele apresenta dados históricos para explicar de onde essa idéia surgiu e argumenta que não há evidências científicas que comprovem um aquecimento global provocado pela ação do ser humano, afirmando que a transformação do CO2 em vilão é um absurdo. A provável causa do aquecimento (em outras eras e também no século XX) seria o Sol (aumento das explosões solares). O interessante é que eles condenam a transformação do CO2 em vilão e fazem a mesma coisa com o Sol.

Mas é importante assistir ao documentário justamente para se criar a dúvida, para manter-se alerta, para aprender a ser cético. Uma afirmação interessante feita é a justificativa da grande adesão de vários cientistas à defesa da visão catastrófica do aquecimento global antropogênico. O motivo seria o fato disso render dinheiro na forma de financiamento de suas pesquisas. Isto é muito sério, pois é evidente que pode distorcer os resultados ou pelo menos criar um viés em quem faz a pesquisa (se estou sendo pago para combater o aquecimento global é importante mostrar o perigo que ele pode trazer). Na verdade essa prática na ciência é muito comum. Vários projetos científicos começaram com interesses militares. A ciência está cheia de exemplos de imposturas1.

Mas diferentemente da entrevista do programa brasileiro, o documentário possibilita, ainda que de forma tendenciosa, a compreensão de como a ciência trabalha:

a) Existem dados que são obtidos de experimentos (normalmente já direcionados para certa investigação).

b) Esses dados são interpretados a partir de modelos criados.

c) Essas interpretações são divulgadas (ou não! Como o documentário denuncia).

d) Essas interpretações são compreendidas (ou não) pela sociedade.

Portanto, fica claro que as afirmações feitas pelos cientistas não são verdades absolutas. São afirmações baseadas em modelos. Na entrevista do programa do Jô, o cientista entrevistado combateu o alarmismo sobre o aquecimento global antropogênico, utilizando a mesma tática que ele criticava. Usando sua “voz de autoridade” fazia afirmações contundentes de que tudo era besteira, e de que nenhum cientista sério levava aquilo tudo em consideração.

A impressão que eu tive é que ele estava mais preocupado em gozar seus quinze minutos de fama do que em esclarecer, e é por esse motivo que não menciono o nome dele aqui.

Levantar polêmicas e ir contra o senso comum são maneiras de se ter o nome divulgado, de ser comentado. Em agosto de 2008 “Um grupo de cientistas apresentou uma denúncia perante o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos em Estrasburgo, para que seja paralisado o teste do Grande Colisor de Hádrons (LHC), da Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (Cern), diante do risco de que um buraco negro seja gerado.”2. Há grupos de médicos, jornalistas e ativistas que afirmam que a AIDS não é uma doença contagiosa e/ou que não há relação entre o vírus HIV e a AIDS. É comum também a afirmação em diversos sites de que o homem nunca tenha ido a Lua, que tudo não passou de uma farsa.

O entrevistado do programa  não me pareceu um ativista pró-teoria da conspiração, mas como cientista e professor, principalmente sendo de uma escola pública, ele tem deveres para com a sociedade e deveria tomar mais cuidado ao fazer suas afirmações. Suas convicções pessoais não podem prevalecer sobre sua responsabilidade para com a verdade científica. Se não há provas contundentes sobre a ação do homem no clima do planeta, também não há provas de que essa ação seja irrisória. E mesmo que essas ações não sejam suficientes para uma proporção global, sabemos muito bem que localmente elas já estão causando muitos males. Ou será que ele duvida também do mal que a poluição das grandes cidades faz ao ser humano?

A única ressalva que ele fez foi dizer que, ao negar que a ação humana seja tão destrutiva como se propaga, ele não está dando licença para que as árvores sejam derrubadas. Acho que foi muito pouco. Ele estava falando na maior rede de televisão do país. É obvio que suas declarações podem ser usadas para justificar um maior desmatamento, o descontrole de emissão de poluentes.

Sim, o capitalismo fez com a ecologia aquilo que ele faz com tudo, transformou em mercadoria. Sim, sustentabilidade virou moda. Muito discurso e pouca ação. Banco sustentável? Parece piada.

Ainda assim prefiro a ecologia como mercadoria do que sua não existência. Se os créditos de carbono são uma mentira eu não sei, mas acho importante que florestas sejam preservadas e que árvores sejam plantadas.

Referências:

1- A Impostura Científica Em Dez Lições – Michel De Pracontal – Editora: UNESP

2 – Site do Terra Notícias  – http://noticias.terra.com.br/ciencia/interna/0,,OI3142721-EI238,00.html – acesso em 12 de maio de 2012

O óleo voltou a vazar (parte IV)

novembro 25, 2011

No dia 20 de abril de 2010 ocorreu o maior vazamento de óleo no mar. Foram mais de três meses para que o vazamento fosse controlado.

https://12dimensao.wordpress.com/2010/05/05/o-oleo-esta-vazando/

Agora é aqui no Brasil, Bahia de Campos, detectada pela Petrobras no dia 8 de novembro e informada a empresa Chevron, responsável pela perfuração.

Foram três posts sobre o vazamento do ano passado. Pensei que não falaria mais sobre esse assunto. E acho que não tenho nada a dizer  mesmo.

Deixemos que as imagens falem por si

http://g1.globo.com/economia/fotos/2011/11/veja-fotos-do-vazamento-de-petroleo-na-bacia-de-campos.html#F306740

Após um ano, incêndio no Butantan foi considerado criminoso

setembro 6, 2011

Na semana que vem, dia 15, completará um ano e quatro meses do incêndio que causou a morte de 15 animais e a destruição do maior acervo de cobras, aranhas e escorpiões para pesquisa do mundo, o incêndio de um dos prédios do Instituto Butantan.

No dia 30 de junho ficou pronto o laudo final, que fez com que o ministério público considerasse criminoso o incêndio. Cinco pessoas, todas funcionárias e ex funcionárias do instituto foram consideradas culpadas pelo crime de incêndio culposo, sem intenção de provocá-lo, mas sendo responsáveis por ele, por imperícia ou negligência.

A provável causa do incêndio foi o superaquecimento do depósito, provocado por aquecedores inadequados, colocados próximos a diversos materiais inflamáveis como, papéis, madeira e milhares de litros de álcool. Além disso, o prédio havia sido reformado e não possuía alvará.

A coleção destruída teve início há mais de 120 anos e era referência mundial para diversos outros institutos. Mais de 80 mil serpentes, muitas delas já em extinção foram consumidas pelo fogo.  Entre os aracnídeos, aranhas e escorpiões, a baixa foi de mais de 450 mil espécies. Uma perda irreparável para a pesquisa da biodiversidade. De acordo com Francisco Franco, curador da coleção:

“Foi uma perda total e isso é uma perda pra humanidade. Desde o começo do Instituto Butantan o Vital Brasil começou a guardar cobras para serem pesquisadas. E essas cobras que foram sendo acumuladas serviam de fundamento para as pesquisas e o aumento do conhecimento da biodiversidade de serpentes. Essas cobras todas foram perdidas, hoje não temos mais nada.” 1

Imagine se sua casa sofresse um incêndio sem vitimas, mas que todas as fotos, impressas ou digitadas fossem destruídas. Você consegue imaginar qual seria essa perda? Conseguiria traduzir em valores financeiros? Agora imagine um acervo que além de ter um valor como peça de museu, é objeto de pesquisa para mestrados, doutorados e muitos outros estudos.

Pela declaração do antigo presidente do Butantã, Isaias Raw, podemos entender como algo de tanto valor pode ter sido tão negligenciado. Em 20 de maio de 2010 ele declarou ao jornal Folha de São Paulo que guardar cobras é bobagem e que a pesquisa que era feita com elas era de quinta categoria:

“Aquilo [o acervo] é uma bobagem medieval. Você acha que a função do Butantan é cuidar de cobra guardada em álcool ou fazer a vacina para as crianças?”, disse. Para ele, “não dá para cuidar das duas coisas”.2

Na mesma reportagem da folha há outra declaração de Paulo Vanzolini, o mais importante zoólogo brasileiro vivo, dizendo que a pesquisa pode ser de baixa qualidade científica, mas que a coleção tinha grande valor científico.

Não é de espantar que a ciência e os museus sejam tratados assim no Brasil. Se o país do futebol, primeiro tri campeão do mundo, não conseguiu guardar em segurança a taça Jules Rimet do tri campeonato mundial, roubada da sede da CBF e derretida, em 1983 , imagine então cuidar do acervo de um museu científico. Ainda mais quando o próprio presidente do museu acha que aquilo tudo é bobagem.

Referências:

1-  http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&section=Geral&newsID=a2905549.xml

2 – http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u737834.shtml

 

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/06/mp-diz-que-incendio-no-butantan-foi-criminoso-e-aponta-responsaveis.html

 

Vida diferente da nossa II – A NASA precipitou-se novamente?

janeiro 29, 2011

No post anterior (Vida diferente da nossa) abordei a descoberta da NASA de que uma determinada bactéria (GFAJ-1) parecia ter trocado o átomo de fósforo pelo arsênico na sua estrutura do DNA. O verbo parecer foi usado por mim porque no próprio artigo os autores mencionam a necessidade de confirmações dos seus trabalhos. Após o pronunciamento vários pesquisadores criticaram, não apenas os resultados do trabalho, como a forma de divulgação.

Na revista Scientific American Brasil do mês de fevereiro de 2011 saiu um excelente artigo do professor titular do Departamento de Biofísica do Instituto de Biociências da UFRGS, Jorge Alberto Quillfeldt, coordenador, desde 2003, da primeira disciplina regular de exo/astrobiologia em uma universidade pública brasileira. Neste artigo ele discute as controvérsias em torno da descoberta da NASA.

A principal critica feita à NASA foi sua divulgação pública, antes da aceitação da publicação em uma revista especializada, no caso a prestigiosa revista Science. Não se trata apenas de furo de reportagem. As revistas especializadas, do porte da Science, são extremamente exigentes com os artigos que são publicados. Quando recebem qualquer artigo, ele é enviado a um especialista da área para seu parecer, este especialista pode recomendar que o artigo seja publicado, pode sugerir alterações, ou até mesmo recomendar a não publicação do artigo. Esse trâmite todo é demorado e quando se trata de um assunto polêmico alguns pesquisadores divulgam simultaneamente na mídia em geral. Isso não é visto com bons olhos no meio científico, pois é como se os pesquisadores estivessem fugindo de um pré-julgamento. O artigo vai ser avaliado por todos antes do primeiro revisor.

Várias são as histórias de publicações bombásticas, divulgadas na mídia em geral, cujos trabalhos foram recusados pelas revistas especializadas posteriormente, ou que tiveram seus resultados contestados. Em 1989 os pesquisadores  Martin Fleischmann e Stanley Pons na  Universidade de Utah chocaram o mundo quando anunciaram uma forma simples de produzir enormes quantidades de energia, a fusão nuclear a frio (em breve vou produzir um post detalhando essa história) fato esse que não foi verificado posteriormente. O livro “A impostura científica em dez lições” de Michel de Pracontal editora UNESP, traz diversos casos de erro ou fraude na ciência.

Por que então, uma agência tão importante quanto a NASA, iria usar um artifício desse e colocar sua reputação em risco?

Na verdade não é a primeira vez que ela faz isso. Em 1996, a NASA enviou um artigo à Science, mas antes de sua aceitação foi a público divulgar que “aparentemente” tinham encontrado evidências fósseis de vida extraterrestre, em um meteorito que veio de Marte, encontrado na Antártida, o famoso meteorito ALH84001. Até hoje os trabalhos se mostram inconclusivos, não é possível afirmar se os fósseis são realmente marcianos ou se foram contaminados ao entrar em nossa atmosfera.

Segundo Jorge Alberto a NASA faz essa divulgação com grande estardalhaço, para conseguir uma maior adesão popular, e dessa forma conseguir que o congresso americano libere mais verbas para suas pesquisas. Por exemplo, após o envio das sondas Viking em 1976, a NASA ficou por mais de 20 anos sem pesquisar Marte diretamente, e após a divulgação desse suposto meteorito várias missões à Marte foram enviadas, inclusive com o envio de robôs que puderam explorar o solo marciano.

É bem provável que esse anúncio do ano passado tenha tido o mesmo objetivo, já que a aposentadoria dos ônibus espaciais, principalmente por causa do enorme custo e dos terríveis acidentes, é um sinal de que houve um bom corte nos investimentos.

Jorge Alberto qualifica como inadequada cientificamente essa atitude da NASA, mas acredita que esse tipo de pressão popular é importante para contrabalançar os gastos com ciência, dos gastos com armamento militar, em suas palavras:

“(…) parece-nos bastante apropriado que se gaste mais com ciência e menos em armas e guerras, pois o benefício da ciência se estende a toda humanidade”.

Eu concordo com ele, mas trocaria a palavra estende por pode se estender, ainda estamos longe de ter essa consciência global, os benefícios da ciência estão normalmente associados àqueles que investiram nela (grandes empresas e corporações) e que buscam o retorno, geralmente com um fator multiplicador absurdo.

Mas voltando ao trabalho divulgado no ano passado, o que está sendo contestado?

A grande dúvida é se o elemento fósforo foi realmente trocado pelo arsênico na estrutura do DNA. Vários pesquisadores acham difícil que isso tenha realmente ocorrido, e alegam que os dados fornecidos não são conclusivos.

O fósforo ocupa um lugar central no esqueleto molecular da cadeia do DNA. Se esse lugar fosse ocupado pelo arsênico, ao invés do fósforo, ele não duraria muito tempo em contato com a água. Essa é uma evidência de que não houve substituição completa, alegam os críticos.

Tirando-se a questão da divulgação precipitada, não há nada de errado em divulgar um trabalho com essas questões duvidosas. É assim mesmo que se faz ciência e é por isso que existem as revistas especializadas. São meios de divulgação de estudos, onde os cientistas podem debater, discordar, concordar, aprimorar, corrigir. Não há verdades eternas, nem estudos 100% infalíveis.

A equipe da NASA fez uma importante descoberta, que pode enriquecer bastante a questão se estamos ou não, sozinhos no universo. Mas ela (NASA) é um instituto de pesquisa como outro qualquer. Diferentemente dos times de futebol milionários, dos programas de reality show, do mundo da moda, dos orçamentos militares, esses institutos de pesquisa trabalham com ciência, cujo retorno financeiro não é sempre certeiro e pior nem sempre é visto com bons olhos pela sociedade. Quantos de vocês já não ouviram:

“Mas também, que os cientistas têm que ficar querendo saber de tudo? Que interessa saber se tem vida lá fora? Não é melhor cuidar da vida aqui de dentro?”

Esse tipo de raciocínio estreito é muito comum infelizmente, não vou respondê-lo agora, ou melhor, segue outro tipo de resposta:

“… quando a ignorância é felicidade,

é loucura ser sábio.”

Thomas Gray

Bibliografia:

Quillfeld, J.A. Controvérsias em torno das bactérias arsênicas – Scientific American Brasil ano 9 n 105 – paginas: 64 a 69.

Vida diferente da nossa

janeiro 17, 2011

Salvador Dalí - "Ovo Cósmico"

Começo 2011 com uma notícia já velha de 2010: A descoberta, feita pela NASA, de uma bactéria que usa o elemento químico arsênio (ou arsênico) no lugar do elemento fósforo, para sua sobrevivência.

Em 29 de novembro de 2010, a NASA anunciou que faria uma coletiva de imprensa para anunciar uma descoberta em astrobiologia. Evidentemente a especulação foi geral, seria a tão esperada comprovação de vida fora da Terra?

A decepção, para quem esperava algo assim foi grande, mas a descoberta anunciada é muito importante para a ciência. Felisa Wolfe-Simon e seus colegas descobriram uma bactéria, que foi chamada de GFAJ-1, em um lago da Califórnia (Lago Mono) que não só suporta quantidades grandes de arsênico (um veneno para quase todas outras formas de vida) como parece substituir o fósforo por esse elemento. Mas porque isso é tão importante?

Bactéria GFAJ-1

Um amigo meu, professor de biologia, ficava irritado quando os alunos o questionavam com a seguinte pergunta: “Mas e se descobrirmos uma forma de vida diferente da que temos aqui?” Ele ficava irritado porque passava várias aulas discutindo com eles o conceito do que é vida, e uma questão como essa colocava por terra toda a discussão. Deixa eu me explicar melhor.

Em ciência precisamos definir alguns conceitos para criar uma teoria. Há definições que são extremamente simples, algumas mais complexas e outras que nem conseguimos definir claramente, como o conceito de energia (alguns podem discordar dizendo que energia é a capacidade que um corpo tem de realizar trabalho, mas no meu entender essa é uma definição muito pobre) e o conceito de vida.

Vejamos por exemplo a definição de água: Substância formada por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. Uma definição bem simples não? Mas e se tivermos um átomo de oxigênio a mais? H2O2 seria ainda água? A resposta é não, pois a definição foi clara, dois átomos de hidrogênio e somente um de oxigênio. No caso essa substância é um peróxido, a água oxigenada. Para complicar mais um pouco esse mesmo exemplo, suponha que tenhamos os átomos de hidrogênio trocados pelo seu isótopo o deutério (isótopo é um elemento químico que tem o mesmo número atômico mas diferente numero de massa). Teremos então a substância d2O que é chamada água pesada. Ela tem esse nome porque o hidrogênio é o único elemento que não tem nêutron em seu núcleo, ele é formado apenas por um próton e um elétron, o deutério possui no núcleo, um próton e um nêutron, dessa forma sua massa atômica é o dobro da massa do hidrogênio, por isso a substância é chamada de água pesada ou óxido de deutério, e suas propriedades não são iguais a da água, apesar dela existir junto com a água (estima-se que para cada 1 litro de água exista uma molécula de água pesada).

A definição do que é vida é bem mais complicada do que a definição do que é água. Na verdade não há um consenso entre os biólogos sobre o que é vida. Por esse motivo o professor de biologia que eu mencionei ficava várias aulas discutindo sobre esse assunto. Quando os alunos perguntavam “Mas e se for encontrado uma forma de vida completamente diferente da existente na Terra?” Significava que eles não tinham entendido que vida é uma definição. Se for encontrado algo completamente diferente, então não será vida, será outra coisa. Ou o conceito de vida terá que ser ampliado para acrescentar essa outra forma.

Uma característica interessante sobre os seres vivos é que todos eles possuem em sua constituição os mesmo elementos químicos básicos: carbono (C), hidrogênio (H), oxigênio (O), nitrogênio (N), fósforo (P) e enxofre (S), normalmente nos referimos a esses elementos como CHONPS. Obvio que esses não são os únicos elementos presentes nos seres vivos, mas nenhum ser vivo conhecido prescinde desses elementos (isso até a entrevista da NASA).

A bactéria GFAJ-1 encontrada no lago Mono parece conseguir trocar o elemento fósforo pelo arsênio. Digo parece porque os próprios pesquisadores mencionaram a necessidade de novos experimentos para comprovar os primeiros estudos. Além disso, a substituição total do fósforo pelo arsênio foi feita em laboratório, o que não descarta o fato de que ela talvez exista na natureza, mas também não confirma. Os pesquisadores foram reduzindo gradativamente a presença de fósforo e acrescentando arsênio, até que nenhum fósforo estivesse presente e a bactéria continuou se reproduzindo mesmo na ausência do fósforo. Usando técnicas de detecção, foi possível confirmar a presença de arsênio no DNA das bactérias.

Lago Mono

Dessa forma podemos dizer que o conceito de vida deverá ser ampliado. A busca por formas de vida fora de nosso planeta, não poderá descartar formas de vida que substitua algum elemento químico por outro semelhante. A troca do elemento carbono por silício já foi especulada há bastante tempo e já foi explorada na ficção científica, como no seriado “Star Trek” (Jornada nas estrelas).

Carl Sagan afirmava que a descoberta de que existe vida em outro lugar do universo, de que não estamos sozinhos, seria a maior descoberta científica de todos os tempos. O anuncio da NASA passou muito longe da descoberta que Sagan se referia, mas ainda assim foi uma descoberta de peso.

“Nossa descoberta é uma lembrança de que a vida como nós a conhecemos pode ser muito mais flexível do que nós geralmente assumimos ou mesmo que podemos imaginar,” afirmou a pesquisadora Wolfe-Simon.

“Esta história não é sobre arsênio ou sobre o Lago Mono,” diz ela. “Se alguma coisa aqui na Terra faz algo tão inesperado, o que poderá fazer a vida que nós ainda não conhecemos?”

Uma vez perguntaram ao grande físico experimental Michael Faraday “Para que serve essa sua invenção?” Ele respondeu: “Para que serve um bebê?” Com isso Faraday queria dizer que é impossível prever qual a utilidade de uma nova descoberta.

Ainda não podemos definir o que é vida, mas essa ignorância não nos impede de ir além.

 

Referência Bibliográfica:

A Bacterium That Can Grow by Using Arsenic Instead of Phosphorus
Felisa Wolfe-Simon, Jodi Switzer Blum, Thomas R. Kulp, Gwyneth W. Gordon, Shelley E. Hoeft, Jennifer Pett-Ridge, John F. Stolz, Samuel M. Webb, Peter K. Weber, Paul C. W. Davies, Ariel D. Anbar, Ronald S. Oremland
Science
2 December 2010
Vol.: ScienceXpress
DOI: 10.1126/science.1197258

Brasil possui curso de engenharia em nanotecnologia

setembro 13, 2010

Cena do filme "Viagem Fantástica"

A nanotecnologia é a tecnologia do mundo do muito pequeno. O prefixo nano quer dizer uma parte em um bilhão 1/1.000.000.000 =10-9. Portanto, nesse tipo de tecnologia os objetos manipulados estão em escala molecular, ou até mesmo atômica. Para se ter uma ideia da ordem de grandeza que estamos falando (se é que se é possível ter essa ideia) um nanômetro está para um metro, na mesma proporção que a medida de 150 m está para a distância da Terra ao Sol (é acho que não é mesmo possível se ter uma ideia clara sobre isso, mas deu pra perceber que é muito, mas muito pequeno).

O primeiro a perceber a potencialidade desta tecnologia foi o mais famoso físico norte-americano Richard P. Feynman, em uma palestra para a Sociedade Americana de Física em 1959, palestra esta intitulada: “Há muito espaço lá embaixo”. Segundo Feynman seria possível num futuro não muito distante a manipulação átomo por átomo para criar novos materiais. É praticamente isso o que está sendo feito atualmente.

Diversos novos materiais foram criados a partir da nanotecnologia, como os já famosos nano tubos de carbono. E isso não é apenas um brinquedinho dos cientistas, muitas aplicações práticas já estão sendo utilizadas na indústria, medicina, informática e outras áreas.

Uma aplicação, ainda pertencente só a ficção científica, é a introdução de um nanobot (um nano robô) em um ser vivo doente, como por exemplo, com um tumor maligno. O nanobot migraria através da corrente sanguínea até o local do tumor e lá poderia combatê-lo sem prejudicar nenhuma célula sadia. Quem assistiu ao filme “Viagem fantástica” deve estar se lembrando do filme agora: Um submarino com uma equipe de médicos e cientistas é miniaturizado e injetado no corpo de um paciente que sofre de um tumor no cérebro inoperável. O filme é de 1966 e seu roteiro foi escrito com base em uma história do brilhante físico e escritor de ficção científica Isaac Asimov. Diferentemente do que normalmente acontece, a história foi escrita por encomenda para o roteiro do filme. Mas parece que Asimov não gostou do filme e decidiu contar ele mesmo outra história lançando: Viagem fantástica II. Apesar de ter visto o filme quando ainda era adolescente ( e muito tempo depois dele ter sido lançado, afinal não sou tão velho assim) lembro-me de ter gostado muito do filme e até hoje lembro de várias cenas, como o ataque que os glóbulos brancos fazem ao submarino, ou o terrível momento em que eles tem que atravessar as válvulas do coração. Os efeitos especiais são fantásticos para a época.  

Como toda forma de tecnologia, a nanotecnologia não está livre do seu lado deletério. Uma das grandes preocupações é o descontrole desse tipo de partícula. Como são extremamente pequenas poderiam contaminar o ambiente e até seres vivos. Por se tratar de um tipo de material completamente novo, criado artificialmente, não sabemos que complicações podem advir dessa contaminação.

Mas a nanotecnologia já é uma realidade e não apenas uma promessa. Já existem no mercado diversos produtos produzidos ou melhorados através do uso dessa técnica. As potencialidades estão se mostrando incríveis. Poderemos afirmar, em pouco tempo, que o país que ficar fora desta nova tecnologia será comparado a ter ficado de fora do avanço da microeletrônica tempos atrás, gerando uma dependência tecnológica em áreas vitais hoje como a informática e as telecomunicações.

Neste ano dois cursos de graduação de engenharia incluíram a modalidade engenharia em nanotecnologia, os dois no Rio de Janeiro: UFRJ e PUC. Antes da abertura desses cursos a modalidade só existia para cursos de pós graduação ou especialização.

Essa nova carreira exige um engenheiro com uma formação mais diversificada nas áreas de física, química, biologia, eletrônica e computação. Por esse motivo a necessidade de se criar um novo curso.

Para maiores informações sobre a importância da nanotecnologia consulte o site do ministério da ciência e tecnologia – MCT: http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/77609.html.

Célula Sintética – Brincando de Deus? Não! Não é brincadeira.

agosto 30, 2010

 

Já faz tempo. Estou atrasado. Mas o assunto é tão importante que fiquei adiando para tentar fazer um grande Post. Mas o tempo foi passando e agora estou mais preocupado em comentar o ocorrido antes que ele fique muito ultrapassado.

No post Cérebro Eletrônico comentei que é difícil perceber que podemos estar imersos numa profunda revolução. Eu estava me referindo aos avanços da inteligência artificial. Agora o assunto é ainda mais intrigante e polêmico: A possibilidade de obtenção de uma vida artificial.

A definição do que é vida é algo bem complexo e os próprios biólogos não chegaram a um consenso. Um vírus é um bom exemplo de como é difícil essa definição. Ele preenche vários critérios para ser chamado de vivo, mas não possui um DNA próprio, portanto não há consenso se ele é ou não um ser vivo.

Após a descoberta da estrutura do DNA, feita por James Watson e por Francis Crick em 7 de março de 1953, a biologia, movida pela engenharia genética, passou a ocupar o posto que antes era da física: A ciência dos avanços extraordinários e também na categoria inventos “perigosos”, como as armas nucleares. A síndrome de frankeinstein (um invento que se volta contra seu criador) está por trás desses medos. Imagine um novo ser vivo, criado totalmente pelo homem, escapando do seu controle e se espalhando pela natureza.

Apesar de não ser possível descartar essa catástrofe, não consigo ficar realmente muito preocupado com isso. Perigos há em toda tecnologia, seja ela nova ou velha e devemos sempre ficar atentos a esses perigos, por menor que seja a probabilidade. O enfoque que quero dar a obtenção da célula sintética (que ainda está longe de ser a criação de vida artificial) é outro.

Façamos um pequeno retrospecto de avanços em áreas parecidas:

25 de julho de 1978 – Nasce o primeiro bebê de proveta do mundo, uma fertilização “in vitro”.

Fins dos anos noventa – Polêmica com os alimentos geneticamente modificados.

5 de julho de 1996 – É feita a primeira clonagem de um mamífero: a ovelha Dolly.

Inicio do século XXI – Polêmicas sobre pesquisas com células tronco.

Maio de 2010 – Criação da célula sintética.

O biólogo e empresário Craig Venter e sua equipe anunciaram a criação da primeira célula sintética, uma bactéria se reproduziu a partir do DNA de outra bactéria, o qual foi seqüenciado por um computador e montado, pedaço por pedaço, em laboratório.

Para entender o que foi feito precisamos primeiro esclarecer algumas coisas básicas. No filme “Jurassic park”, os dinossauros são criados a partir da obtenção de seu DNA. Segundo o filme, essa obtenção se deu através do sangue sugado por um inseto que ficou aprisionado em um fóssil. Apesar de o filme ser uma ficção e por isso não ter necessariamente que corresponder à realidade, um erro conceitual grave acabou sendo veiculado, o de que o DNA é a matéria prima para se fazer um ser vivo. É como se tendo o DNA de qualquer animal eu pudesse fazê-lo em laboratório.

O Paleontólogo e biólogo evolucionista, Stephen Jay Gould, escreve um artigo no livro: AS COISAS SÃO ASSIM – Pequeno repertório científico do mundo que nos cerca” e explica muito bem que tipo de erro é esse. O DNA é apenas um código genético, uma instrução de COMO fazer um animal e não a matéria prima. É uma espécie de manual, na analogia de Gould: é como um manual de como fazer um carro, ter o manual não garante que possamos fazê-lo. São necessários vários itens, como: máquinas, aço, vidro, plástico, eletrônica, etc. Além disso é preciso da mão de obra qualificada. A mesma idéia pode ser pensada com relação ao DNA, ele é a instrução para a construção de proteínas e são essas as grandes responsáveis pela “construção” do ser vivo.

Todos os seres vivos são feitos de células e essas se reproduzem constantemente (há exceções, como os neurônios e as células reprodutivas femininas). Nessa reprodução duas células idênticas a original são criadas e o DNA é o responsável pela fidelidade da cópia. Imaginem que após tomar um sol excessivo na praia, algumas células da sua pele morrem e você começa a descascar. Evidentemente as células devem ser substituídas por células idênticas às anteriores, não seria nada agradável se as células do nariz fossem substituídas por células do pé. Já imaginou um pé nascendo no nariz? Brincadeiras a parte, usando manipulação genética cientistas já conseguiram produzir em laboratório aberrações como essa (apesar de a intenção ser a melhor possível) veja nesse link: http://www.comciencia.br/reportagens/2004/10/08.shtml uma orelha humana que “nasceu” nas costas de um camundongo.

Podemos agora voltar à criação da célula sintética. Venter  e sua equipe, utilizaram uma determinada bactéria (Mycoplasma capricolum) e retiraram completamente seu DNA. Um novo DNA foi obtido de outra bactéria (Mycoplasma mycoides), e inteiramente montado no computador, com algumas modificações. Dessa forma pode-se diferenciar o código genético sintético do natural. Obtido esse novo código o grande desafio seria implantar esse DNA em uma célula e verificar se ela poderia se reproduzir. Será que um DNA recriado por um programa de computador poderia dar origem a vida?

A resposta foi positiva. Após a implantação do DNA sintético na bactéria Mycoplasma capricolum da qual havia sido retirado o DNA, a bactéria se reproduziu normalmente como se fosse a mycoides . Não podemos dizer que um ser vivo artificial foi criado, pois foi usada uma célula viva que já existia, mas como o código genético foi modificado temos uma célula sintética, isto é, artificialmente construída, uma vez que não há na natureza nenhum ser vivo com um código genético idêntico a esse.

A façanha foi incrível e as aplicações podem ser imensas. O objetivo é produzir bactérias que possam ter propriedades desejadas como por exemplo, que se alimentem de óleo e possam ser usadas para limpar os oceanos contaminados por derramamento, ou ainda bactérias que absorvam gases estufas como o CO2, plantas que absorvam energia solar e transformem em eletricidade, bactérias que geram biocombustível e muitas outras funções.

O medo por traz dessas experiências é a produção de um ser vivo cuja ação possa ser maléfica para nós ou para o meio ambiente e que esse ser escape ao nosso controle. Apesar de esse medo ser real, não é muito diferente de armas nucleares caindo em “poder” de terroristas, ou mesmo que elas possam ser usadas por algum país numa eventual guerra. Ou ainda, como já aconteceu, o uso indiscriminado da radioatividade no início do século XX, antes que os efeitos deletérios fossem percebidos, o mesmo aconteceu com o raio-X. O medo de catástrofes como essas não vai impedir que os inventos sejam feitos, nem mesmo a clonagem humana parece estar livre disso, apesar de vários países terem na proibido.

O próximo passo que será tentado pela equipe de Venter é a obtenção de uma célula realmente artificial, isto é, a criação de uma nova forma de vida, feita inteiramente pelo homem. A questão que me parece mais importante nessa façanha é o levantamento da seguinte questão: Não há necessidade de algo sobrenatural para a criação da vida? Podemos ser obra do acaso? Um simples programa de computador é capaz de criar, com base em regras gerais da física e da química, instruções para que uma nova forma de vida surja?

Acredito que um forte argumento para aqueles que não acreditam em Deus possa surgir daí. Evidentemente as entidades religiosas não aceitarão esse argumento. Talvez, inclusive, usem o próprio feito para afirmar que a vida só pode ser criada por um ser inteligente, alegando que há a necessidade de um ser inteligente (nós) para o feito.

Mas a questão é que apesar de inteligente, não estamos além da natureza, não somos sobrenaturais, não somos deuses.

Assim como aconteceu com o bebê de proveta e com a ovelha Dolly, um grande alarde surge no momento da notícia. “O homem está brincando de Deus!” Decorrido certo espaço de tempo, os procedimentos tornam-se mais freqüentes, ou até mesmo corriqueiros, como a fertilização “in vitro”, que nos dias de hoje se tornou  uma prática mais que corriqueira, mas que foi alvo de muitos protestos e debates na época do primeiro bebê de proveta.

Provavelmente acontecerá o mesmo com o feito de Craig Venter, mesmo que ele consiga criar realmente uma vida artificial. A tecnologia parece um trator que sai atropelando tudo que aparece pela frente. Como se não desse importância aos protestos, oposições e receios.

A rapidez com a qual as descobertas vão sendo feitas, torna difícil, se não impossível, a avaliação por parte da sociedade sobre o impacto que elas podem gerar. Além disso as descobertas geralmente são universais, podem ser usadas por todos os países (pelo menos em princípio), mas cada país possui uma legislação diferente, costumes diferentes, nível de educação diferente. Não dá para se esperar que haja um consenso. Mesmo em questões aparentemente mais simples, como desenvolver ou não uma arma de destruição em massa.

Dessa forma a célula sintética, e mesmo a obtenção de uma vida completamente artificial, passará pela sociedade como mais uma conquista tecnológica, e não provocará um grande debate na sociedade. Perde-se mais uma vez a chance de crescimento intelectual, de aprendizado. Os religiosos se fecham no seu obscurantismo, queixando-se da pretensão humana, enquanto os cientistas e tecnólogos continuam embarcando nessa locomotiva sem freio.

O que ganharíamos com um grande debate? A certeza de que Deus existe? A certeza de que a religião é dispensável? Acredito que nem uma coisa nem outra. Mas acho que começaríamos a nos importar de verdade em saber o rumo que                 queremos tomar. Não sou a favor de se tentar por um freio na tecnologia, mas não me agrada não saber para onde essa locomotiva vai. Acredito que no mínimo conseguiríamos aprender bastante. Falo de um aprendizado conjunto, significativo e em larga escala.

Como cientista me sinto muitas vezes isolado num mundo onde a grande maioria se fecha para o que a ciência tem a mostrar. Mas não faço coro com alguns arrogantes que julgam que o progresso é inevitável e que só a ciência é que detém o saber.

A questão é como mudar isso? Como não transformar a discussão religião x ciência em um jogo de adversários?

Gostaria de ter essa resposta, não tenho ideia de como fazer. Sei apenas, que não funciona do jeito que está sendo feito. A cada nova descoberta a mídia faz algumas matérias, “explica” para o público leigo o que foi feito, o público reage com indignação, mas a grande maioria não tem a menor ideia do que foi feito. E o assunto desaparece (afinal de contas o LHC criou ou não buracos negros que poderiam destruir o mundo?).

No fundo o objetivo da grande mídia não é informar, mas vender uma matéria. Ocupar o espaço nobre que o patrocinador está bancando.

Por que um evento mundial como uma copa do mundo ou uma olimpíada não pode acontecer na área da ciência? Não no sentido de competição, mas me refiro ao alcance, ao investimento feito. Lembro-me que na minha infância, o voleibol era um esporte desconhecido. Quase ninguém conhecia as regras, quase não havia torcida. Algo aconteceu que transformou essa realidade e hoje ele já é o segundo esporte nacional. Por que o mesmo não pode acontecer com a ciência?

Quem sabe um dia as manchetes: “Brincando de Deus” possam ser trocadas por: “Agindo como seres humanos”.

Cobra, lagartos e a ostentação humana.

agosto 15, 2010

O modismo de criar bichos exóticos em casa pode custar caro à biodiversidade de alguns lugares. Na flórida, Estados Unidos, região dos Everglades (parque nacional  norte americano), grandes serpentes introduzidas no lugar pelo ser humano estão ameaçando a biodiversidade local, segundo reportagem de março desse ano da revista Scientific American Brasil número 94. Como não pertencem a esse habitat, esses predadores que podem chegar a 6 metros de comprimento e 90kg de massa, são capazes de produzir até 100 filhotes em cada ninhada, e por estarem no topo da cadeia alimentar não possuem inimigos naturais expandindo seu território a cada ano. Em 2000 duas pítons birmanesas foram capturadas no parque americano, em 2008 foram capturadas 343, mas dezenas de milhares devem estar vivendo no parque segundo os biólogos.

Além das pítons, jiboias e quatro espécies de sucuris começaram a aparecer e não estão ficando apenas na região do parque.

Em seu habitat natural, as cobras possuem predadores, no caso das píton, que vivem no sudoeste da Ásia, chacais, lagartos-monitores, doenças e parasitas limitam o crescimento da espécie. Mas no Everglades as cobras devoram até crocodilos de 1,2 m, embora prefiram pequenos mamíferos e pássaros.

Os biólogos sabem por experiência própria que a introdução de uma nova espécie em um habitat pode ocasionar um grande desequilíbrio, como aconteceu com a ilha americana de Guam, onde uma cobra-arbórea-marrom invadiu a ilha logo após a segunda guerra mundial e acabou com 10 espécies de aves nativas das 12 que havia, a maioria da população dos morcegos foi dizimada e metade de seus lagartos desapareceram.

Mais uma vez ações individuais, aparentemente inocentes, comprometem o meio ambiente e a biodiversidade. Nas grandes cidades, os pombos estão se transformando numa verdadeira praga, sendo foco de transmissão de várias doenças. Cães e gatos são tratados como entes familiares, mas quando dão cria os filhotes são, muitas vezes, abandonados em qualquer lugar.

Por que criar em casa um animal selvagem? Por que não se contentar com um cachorro, um gato, um pássaro, um peixe? Bom, se for amor aos animais, então é melhor pensar melhor nas implicações de suas ações para com eles.