Posts Tagged ‘física e lost’

Viagem no tempo – Parte II

abril 15, 2011

Estou agora coçando a cabeça e pensando: “Onde é que eu fui me meter…..” Na parte I deixei claro que sempre evitei escrever sobre viagens no temo, pois o assunto é complexo, e por não conseguir me livrar dessa mania de ser professor, quero explicar, ensinar, enfim dar uma aula sobre o tema. Mas aqui não é lugar para aulas. Nessa série de posts sobre viagens no tempo vou discutir aleatoriamente sobre teorias, livros, filmes, etc., sem uma preocupação em ser didático. Como se fosse um bate papo, uma conversa de botequim.

Para aqueles que quiserem saber mais vou indicar alguns livros e ou artigos interessantes. Por exemplo: indico fortemente o livro “O FUTURO DO ESPAÇO-TEMPO”, da Companhia das Letras. São seis artigos escritos pelos físicos: STEPHEN W. HAWKING, KIP S. THORNE, IGOR NOVIKOV, TIMOTHY FERRIS, ALAN LIGHTMAN E RICHARD PRICE.

Os artigos são ótimos, inclusive o do Stephen Hawking, bem melhor do que seus livros mais famosos. O do russo Igor Novikov propõe uma saída interessante para o famoso paradoxo de voltar ao passado e impedir que sua mãe encontre seu pai e dessa forma você não teria nascido, logo como poderia ter voltado ao passado? Esse tipo de paradoxo, explorado no clássico “De volta para o futuro”, um filme de ficção científica norte americano de 1985, dirigido por Robert Zemeckis. Segundo Novikov, o paradoxo só existe porque insistimos em achar que existem duas realidades, o passado inalterado (antes do viajante do futuro chegar) e o passado com a visita do viajante do futuro (como acontece no filme). Para Novikov a volta ao passado implica uma alteração já no passado inalterado, isto é, quando ele ainda era presente. Ta confuso né? Vou tentar melhorar com um exemplo:

Imagine um jogo de sinuca onde uma bola está indo para uma caçapa, mas ao entrar na caçapa ela volta no tempo e aparece, alguns segundos antes, da sua versão antiga entrar na caçapa, ela então colide com sua irmã gêmea impedindo que ela entre no buraco onde voltaria no tempo. Criamos então um paradoxo, a bola entrou ou não na caçapa?

O que Igor Novikov argumenta é que o paradoxo só existe porque imaginamos duas situações, a primeira onde só havia uma bola e a segunda onde temos duas bolas. Como ao entrar na caçapa a bola volta no tempo, ela então já aparece desde a primeira vez, teremos então duas bolas, e a segunda bola poderá até colidir com a primeira bola, mas não vai alterar significativamente a trajetória dela, de forma que seu destino está traçado, ela vai entrar na caçapa para então colidir com sua versão mais nova. Não há formas de evitar que a bola entre na caçapa, pois nesse caso teríamos o paradoxo. Se a bola voltou ao passado, então isso ocorreu, e pronto, não houve uma versão onde só havia uma única bola.

Nessa visão o livre arbítrio está condenado. Ele começa a discussão com bolas de bilhar, pois elas formam um sistema físico simples. Depois o russo passa para casos mais complexos, sempre argumentando da mesma forma. Mas bolas de bilhar não tem vontade própria. Fica difícil imaginar porque não poderíamos mudar uma decisão tomada anteriormente. Por exemplo: Digamos que você entre numa máquina do tempo. retornando em meados dos anos 90, e invista em uma empresa recém criada chamada Google. Em alguns anos você tornar-se-á um milionário, assim que as ações dessa empresa dispararem. Mas se Novikov estiver certo isso será impossível, se você não é um milionário hoje, então você não terá como se tornar um milionário no passado. Se era para acontecer já teria acontecido desde a primeira vez Mas o que poderia impedir você de comprar essas ações? Novikov argumenta que essa violação no livre arbítrio pode parecer estranha, mas não é impossível: assim como não podemos andar pelo teto, porque a lei da gravidade nos proíbe, não podemos alterar o passado.

Bem você acha que ele pode estar certo?

Será que outros físicos pensam de forma diferente? Aguardem viagem no tempo parte III.

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LOST:QUANDO A FICÇÃO ENCONTRA A FÍSICA.

abril 6, 2010

Quando entrei na graduação de Física quase todos meus colegas eram fãs do seriado Star Trek (no Brasil Jornada nas estrelas). Particularmente eu era exceção, não porque não gostasse, mas porque o horário do seriado coincidia com o da novela e minha mãe não abria mão de assistir ao teledrama.

Hoje a TV a cabo possui vários seriados que fascinam amantes da ciência ou de ficção cientifica. A comédia  “The Big Bang theory” traz no próprio nome a referência de uma teoria da Física. CSI: Crime Scene Investigation (no Brasil CSI: Investigação Criminal) é um show de efeitos especiais e usa várias áreas da ciência para desvendar crimes.  Mas a sensação do momento nos últimos anos é Lost. Mistérios não faltam naquela ilha e as explicações para os mesmos têm levantado as mais variadas discussões em fóruns, blogs, twitter, Orkut e rodas de conversas.

É bastante claro que a intenção dos autores é mesclar mistério, ficção e ciência. Eletromagnetismo, viagens no tempo, armas  nucleares, professores de Química e até uma referência direta a um dos maiores físicos experimentais, Michael Faraday, que empresta seu sobrenome a um dos personagens, Daniel Faraday, que não por acaso é um físico que vai parar na ilha em busca de testar suas teorias. Agora, na última temporada da série mais uma área exótica da Física: os universos paralelos.

O seriado conquistou muita gente, aficionados ou não de ciência. Muitos alunos vêm me perguntar sobre a física de Lost e até propor uma aula sobre a série, pois acreditam que a Física possa responder aos inúmeros mistérios da ilha, inclusive a enigmática fumaça preta que desde a primeira temporada intriga a todos.

Em 2008 o seriado foi abordado à luz da Física moderna no trabalho de tese do Colégio Oswald de Andrade  intitulado Física não é só para nerds.  Os rótulos atribuídos àqueles que se dedicam à ciência. Apesar de ser um trabalho do ensino médio,  a aluna Maria Fernanda Sader Basile discute as relações da Teoria da Relatividade e da Física Quântica com os mistérios da ilha. A abordagem do trabalho não era sobre o que está errado ou certo no seriado, até porque o seriado não tem nenhuma obrigação de ser fisicamente correto, a crítica foi sobre o pré-conceito que os amantes da ciência sofrem, como se gostar de Física ou Matemática fosse sinônimo de pessoas que são completos bitolados como mostram alguns filmes caricatos. Em Lost é possível perceber como a ciência pode ser instigante e desafiadora, como um suspense de Hitchcock.

Uma crítica que pode ser feita ao seriado é o uso que se faz do eletromagnetismo. No final do século XIX, quando o mundo começava a conhecer as aplicações do eletromagnetismo, muitos fenômenos dessa área da Física eram apresentados como números de mágica ou atrações circenses. Estranhamente parece que esse modismo voltou. Palmilhas magnéticas, colchões magnéticos, garrafas térmicas magnéticas, e até calcinhas magnéticas são anunciadas para venda. O magnetismo parece estar associado a milagres impressionantes. O manual da garrafa magnética, por exemplo, diz que o magnetismo quebra as moléculas de água e com isso propriedades terapêuticas são obtidas. Bem, confesso que não sei se é possível quebrar as moléculas de água usando campos magnéticos tão fracos quanto os produzidos pelos ímãs da garrafa, mas, ainda que isto seja possível, quando estou com sede quero beber água (H2O com sais minerais) e não uma molécula de água “quebrada” (o que seria uma “molécula quebrada” de água? Hidrogênio? Oxigênio? Água oxigenada? Na dúvida fiquei com meu filtro de barro mesmo).

Por ser uma série tão inteirada com as novidades científicas, achei estranho que os autores de Lost fizessem uso justamente do eletromagnetismo como fonte de energia para provocar as viagens no tempo e outros efeitos. Autores tão imaginativos deveriam ter buscado inspiração em outras fontes de energia, mas, como já disse, o seriado é uma ficção e, portanto, não possui nenhum compromisso com as verdades científicas.

Apesar deste detalhe, a série é muito intrigante, principalmente pelas amarrações que vão acontecendo entre os personagens desde a primeira temporada. Parece que o sucesso da série foi tanto, que os autores decidiram adicionar mais uma temporada. Com isso algumas amarrações ficaram embaralhadas e confusas. A expectativa agora é saber se eles vão conseguir atar esses nós e ainda por cima solucionar todos os mistérios.  Mas para mim o principal já foi conseguido, mostrar que a ciência, principalmente a Física, não precisa ser enfadonha e cheia de fórmulas incompreensíveis. Ainda que o seriado não seja sobre ciência, ela serve como um pequeno pano de fundo para uma aventura instigante.

Um dos capítulos de que mais gostei foi o episódio 5 da quarta temporada, quando o personagem Desmond está enlouquecendo pois sua mente está viajando no tempo. Ele fica revendo momentos do passado juntamente com o presente e isso vai levá-lo ao colapso. Segundo o físico Daniel Faraday, sua única chance é encontrar uma constante para deter as viagens. Desmond então conversa por telefone com sua amada Penny e assim consegue estabilizar-se no presente. Achei genial a idéia de ser necessária uma constante para frear as viagens incessantes que caminhavam para o infinito. Na teoria do caos existe algo assim: são os chamados atratores, pontos para os quais uma série infinita pode convergir. Não importa se os autores tenham se inspirado nisso ou não, o que importa é que a forma como eles criaram esse episódio foi muito emocionante.

Arte e ciência vivem se encontrando e flertando uma com a outra. Ainda que tão diferentes na forma de operar, podem, quando na dose certa, nos brindar com uma excelente história. Desde um conto de Borges ou Cortázar a uma história de Asimov. Na literatura de Eça de Queirós ou na pintura de Picasso. Nas alucinantes obras de Escher  ou nos inventos de Da Vinci. Assim como o sal e o açúcar fornecem diferentes gostos à comida quando colocados em pratos separados, misturá-los em um mesmo prato pode nos trazer gratas surpresas.